quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Filhos insistentes, pais obedientes.


 Educar um filho, invariavelmente, inclui erros e acertos. Talvez seja por isso que me lembrei da frase (não lembro a autoria): “Educar é uma obra-prima, uma obra realmente artesanal”. Eu costumo descrever a educação como uma tarefa não apenas emocional, assim como obrigatoriamente racional. Por acaso alguém conhece a poção mágica para que os pais possam transformar seus filhos em pessoas felizes?  É em nome dessa “busca pela fórmula perfeita” que a partir dos anos 60, passou-se a conviver com uma verdadeira reforma dos métodos educacionais, comportamentais e pedagógicos. A liberdade passou a imperar nas relações entre pais e filhos e contraditoriamente, a sensação que temos é a de que a incessante procura parece continuar distante do tão sonhado final feliz.
            As conseqüências da permissividade dos pais na educação são seriíssimas. Dados do Ministério da Saúde mostram que mais de 20% das garotas entre 13 e 19 anos já enfrentaram uma gravidez precoce. Por outro lado, uma pesquisa recente revelou que um em cada quatro estudantes do ensino fundamental e médio da rede pública brasileira já experimentou algum tipo de droga, além do cigarro e das bebidas alcoólicas. Em apenas uma década, a idade do primeiro contato com esse tipo de substância caiu dos 14 para os 11 anos. Mesmo que não ocorram desastres, as conseqüências para o futuro podem ser sérias. Jovens educados de maneira negligente correm o risco de se tornar adultos infelizes e desajustados1.
            Antigamente, os filhos davam explicações aos pais. Hoje, são os pais que precisam justificar-se para conseguirem ensinar limites aos filhos. Cada medida precisa estar respaldada em sólidos argumentos que comprovem a veracidade da proposição, e convenhamos: haja perseverança e papo para dar “trocentas” explicações. É uma troca na ordem de papéis e valores altamente prejudicial. Por favor, não me entendam mal, pois não estou fazendo nenhuma apologia à educação de nossos avós e bisavós. Mas precisamos encontrar um ponto de equilíbrio que ficou perdido entre as gerações.
          Em plena época de laissez faire generalizada, os pais devem ultrapassar os limites da educação meramente intuitiva, é essencial ir além e procurar fonte de informações sobre drogas , alcoolismo, sexualidade etc. E que estas não fiquem somente na teoria ou no “eu ouvi dizer”, mas que se integrem naturalmente à rotina familiar. Afinal de contas, regras são indispensáveis para quem vive em sociedade. Mas é bom deixar claro que apenas definir limites não é o suficiente, pois é preciso também ensiná-los a administrarem a própria autonomia para que percebam que a vida não gira em função de seus desejos. Isso parece bem lógico, não é mesmo? Para alguns pais, sim; enquanto existem outros que ainda curvam-se ao desejo dos filhos por receio de frustrá-los, achando que dar tudo de mão beijada é uma maneira de comprar-lhes a felicidade, quando a realidade é justamente o contrário, ou seja, uma criança acostumada a ouvir somente o “sim”, não sabe conviver com a frustração. Pais que não sabem dizer “não” roubam dos filhos o direito de desenvolverem-se emocionalmente e contribuem para a formação de uma geração de crianças, adolescentes e futuros adultos despreparados para enfrentar as exigências do mundo que os cerca.  Aliás, dizer “não”, segundo os especialistas, é um dos exercícios mais importantes para uma educação saudável. O amor não precisa ser “cego” e tudo acatar, como dizem.
                “Mas onde será que nós erramos ? ele sempre teve de tudo”. Frases como essas não são tão difíceis de se ouvir. Está na hora de os pais recuperarem sua auto-estima e sua autoridade", diz a educadora Tânia Zagury, em seu livro, Os Direitos dos Pais. "Perdeu-se a noção de reciprocidade", diz ela. Os pais são obrigados a bancar a melhor educação escolar para os filhos? Então estes últimos também terão sua contrapartida: devem esforçar-se para passar de ano”. Nesse aspecto Içami Tiba também ressalta : “Nunca vi alguém ganhar um aumento ou conquistar um emprego fazendo birra. Entrou na faculdade e ganhou um carro, largou a faculdade e continuou com o carro. Não é assim que as coisas funcionam”. O filho que infringe as regras em casa e não sofre punição, tende a fazer o mesmo em qualquer lugar. E as sanções do mundo lá fora são bem mais rígidas. E sabem o pior disso tudo ? é que o jovem, mesmo com todos as suas vontades plenamente satisfeitas, continuará  infeliz, inseguro e sentindo-se vazio de amor e de objetivos, enclausurado em seu próprio narcisismo.Diante dessa constatação, existe uma verdade irrefutável: para não errar e evitar problemas futuros, a boa educação é aquela iniciada ainda na infância. Nesse sentido, esta deve ser encarada também como um processo sociológico, já que não se pode pensar exclusivamente no prazer imediatista dos filhos, mas levar em consideração o bem-estar de toda a sociedade.
            Nas palestras que faço e tenho oportunidade de conversar com alguns pais, observei um intrigante aspecto: a grande maioria tem consciência da importância de ensinar limites, mas ao que parece, isso ainda não tem sido o suficiente para tornar esta tarefa imprescindível. O resultado tem sido desastroso, pois os pais omissos começam a perder as rédeas da situação, e quando os problemas de comportamento dão sinais, alguns pagam para que seus filhos resolvam essas questões em consultórios, enquanto outros preferem delegar essa tarefa à escola. Outros optam pela “terceirização” dos filhos e os deixam total ou quase unicamente sob o cuidados de babás, creches etc. e o contra-senso fica por conta de que, se por um lado tomam essa decisão, por outro sentem-se culpados pela própria ausência e para supri-la começam a ceder a tudo indiscriminadamente, muitas das vezes mesmo indo contra seus valores e crenças.
             Bem, após tantas considerações, nos perguntamos: será que a tal poção mágica existe mesmo? Devemos levar em consideração que hoje vivemos um novo conceito de família mais interativa, dinâmica, participativa, embasada no diálogo entre pais e filhos. Entretanto não podemos ignorar conceitos consagrados, herdados de gerações mais antigas. Junte-se à essa interseção de valores, boas doses de bom senso, paciência e afeto, assim teremos algo bem próximo do que almejamos. Acho que cada pai/mãe deve montar sua própria poção, que de mágica não deve ter nada, e sim deve estar respaldada na realidade, na ética e na cidadania familiar.
                 "Um pai ou uma mãe que engole os próprios princípios e se cala a cada mal criação dá um atestado de que não se respeita, e os filhos entendem isso como um sinal para que não o respeitem também." (Içami Tiba, 2003).

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